Bater de asas

Postado por Taiane Maria Bonita , sexta-feira, 26 de junho de 2009 14:01


O som do bater de suas asas chegou suavemente aos meus ouvidos, parecia-me estranho ouvi-la naquela sala repleta de luz e tinta branca. A mulher que se postava à frente não cessava sua oratória, sem nem ao menos reparar aquelas asinhas tão delicadas que enchiam de vida o local, normalmente tão vazio.


Não! Vazio, não. Cheio.


Repleto de idéias e de discussões, e repleto de cabeças aflitas que ansiavam em ficar cada vez mais aflitas e cada vez mais cheias. Cabeças aflitas e pensantes, trancafiadas e abafadas por paredes brancas e mulheres falantes. Cabeças limitadas e acorrentadas por regras, padrões e currículos.


E o que será daquelas asinhas alheias à todo esse pseudo-empirismo e essa falsa erudição? O bater de suas asas acarretaria em conseqüências inimagináveis do outro lado do globo terreste. Se tais asas são assim tão poderosas, o que fazem elas perdidas e ignoradas entre quadro paredes de tinta branca?


Ouço a mulher falante, olho para o relógio pela milésima vez, e desvio o olhar para as asinhas coloridas, agora pousadas no centro da tinta branca.

(Obra de Salvador Dalí)

Medieval

Postado por Taiane Maria Bonita , quinta-feira, 25 de junho de 2009 08:14

"Palavras por palavras
Não adianta nem falar
A palavra anda solta
E se propaga no ar

No contexto, um sono manso
Não agüento mais cansar
Desse método de sono
E a História a suspirar

Já que a palavra não envolve
O negócio é navegar
A cristandade vai rolando
E o poema a se criar

Agora os livros se folhando
E lá no quadro um blá-blá-blá
Finalmente terminamos
Vou lá fora papear."

(Beatriz Pereira da Silva)

Ferme tes yeux

Postado por Taiane Maria Bonita , domingo, 14 de junho de 2009 14:01

Ela serrou as pálpebras na tentativa inútil de esquecer o que havia se passado, virou o corpo de lado e apertou o travesseiro, o cheiro dele ainda estava ali. Ela apertou ainda mais os olhos, como se esse ato fosse capaz de apagar a imagem que já tinha ficado gravada na sua retina e registrada em sua memória.


Os cabelos ainda molhados manchavam o amarelo da fronha, o que disfarçava as lágrimas que começavam lhe escorrer pela face. A lágrima e a água ganhavam a mesma tonalidade no tecido que as recebiam, ali não podiam ser diferenciadas. O cheiro do café que ela antes sorvera com lábios suaves de amante, agora se misturava com o cheiro do perfume que o corpo dele deixou. O café e o perfume, juntos tinham cheiro de saudade. E a saudade apertava o peito dela, uma saudade de não se sabe o quê, que vem de não se sabe onde. Uma saudade de um tempo que não passou, já que ela ainda ouvia o som da porta que há pouco ele fechara.


Cabelos molhados, mistura de café e perfume em suas narinas, ela respirou fundo e sentiu pela derradeira vez o calor que a mão dele tinha deixado em seu ventre, ouviu a porta de fora bater e secou a lágrima que escorria pela ponta de seu nariz.



Baseado na historieta “open your eyes” em “do lado de dentro” http://hellenrios.blogspot.com/2009/03/open-your-eyes_21.html

Manifesto do tempo

Postado por Taiane Maria Bonita , terça-feira, 9 de junho de 2009 16:56

Dos que me culpam
e me ocultam.
Dos que me clamam
e reclamam.

Sois vós, oh tempo.
E vós, sou eu.
Estou naquele que viveu e morreu,
Na lágrima que brotou de um sorriso
De um amor d’antes despertado.

Sou invocado, renegado, sou xingado.
E se é minha a culpa tua,
Ficam em minhas costas
O peso da palavra dura.

Que sou eu que apago,
Que sou eu que afago,
Que sou eu o começo.
Sou o fim, e o apreço.

Tempo rei
Tempo lei

Fitas ao vento

Postado por Taiane Maria Bonita 15:00

Para Mayara, Aline e Rafaela, pois se ninguém entender minhas palavras, vocês entenderão! XD









Fitas ao Vento



Fitas ao vento, sorriso na cara, frio no corpo todo. Fitas ao vento, uma cidade a descobrir e o frio a espantar. Era domingo de um inverno rigoroso, as roupas cobrindo o corpo, blusa por cima de blusa, e os casacos eram pesados. O vento era frio mas a animação o superava. Recém chegadas a Curitiba, com sono, cansadas da viajem mas com um sorriso na cara. E a vontade de sair descobrindo o novo mundinho maior do que a necessidade de esperar o credenciamento.

Fila, frio, espera, elevador; daqueles de cinema que deixaria Stephen King louco por uma máquina de escrever. Crachá, caneca, camisinha? Credenciamento! Elevador e finalmente as ruas de Curitiba. Informação, padaria, hummm... café da manhã. Com coca-cola? Quem disse que precisa ser com leite quente?! Pirulito, balança ... regime.


Encontro na reitoria, todos a caminho do céu. Almoço. Olha a bandeja! O feijão é bom! E tem lugar pra por os talheres! Nossa tem suco! E dá pra por o copo também! Um “que chique” em coro. Fim do almoço, vadiagem, passeio pelo... passeio público?! Que nome esquisito! Será que tem pedalinho? Cinco reais! Não quero mais. Os gansos no laguinho, a ponte: “vamos passear na floresta...”. A placa: “não balance a ponte”. O peixe: “veeem aqui”. Meninas podem falar com animais e por que não? Não é por que baleiês não é ensinado nas escolas que ele não pode ser aprendido. Passeio na praça. O que é aquilo? Uma cenoura? Não um teatro. Quanto é a entrada? De graça. Salvem os eventos culturais gratuitos.


O ônibus, o Largo da Orla, material de consumo, pouco dinheiro. Não acredito... o quê? Malabares. Droga não tenho grana. Conversa com o vendedor: “Tio pelo amor de Deus me dá teu telefone que até o fim da semana eu quero um desses.” Entrada no teatro, ou será o que era aquilo? É bonito! Eu quero um malabares! Olha a pintura! Eu também quero um! Vai ter apresentação? Mas não tenho dinheiro! Vamos pro segundo andar? Eu te empresto...


Ligação, espera, animação... pechincha, desconto... e finalmente as três saem com o brinquedo novo na mão. Fitas ao vento. Vamos voltar? Fitas ao vento, bolada na cabeça, nas pernas, ai, nas costas. “Meu deus preciso aprender a fazer isso”. Vamos pedir dinheiro? Vamos. “Somos estudantes de letras participando de um encontro, mas somos desprovidas de dinheiro. Colabora aí!? Olha as meninas são esforçadinhas.” Papai tem muito em casa. “Colabora aí?! Só pra alimentar nosso ego?!” Dezessete reais, praticamente uma fortuna. O que vamos fazer com o dinheiro? Uma viagem! Planos. Jardim Botânico. Tem bastante gente isso significa bastante dinheiro. O guarda: “é proibido pedir dinheiro aqui”, mas o show pode continuar. O despiste. Fitas ao vento, uma grande platéia, fitas ao vento, empresários novos, fitas ao vento, sessenta centavos. E assim termina a nossa participação artística pedinte cultural no ENEL - Curitiba.

Da distância

Postado por Taiane Maria Bonita , quarta-feira, 3 de junho de 2009 10:26

Das vezes que pensei que a distância me feria
Que judiaria!
Quisera eu que soubesse
A grandeza de sua valia.

Encontro-me aqui
Tão perto, que me sufoca
O calor da tua ausência.

Que me dera, reclamar
Dos quilômetros a rodar
Ou das horas a esperar

Ou tão somente
De que não está mais na minha frente.